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Quinta, 02 Maio 2024

Caderno de Encargos para a Metro e STCP facilita despedimentos

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Por Abel Coentrão in Público de 16 de Outubro de 2014

stcp-logo“Novo” documento retirou limites à sub-contratação de serviços a entidades externas e penalizações para o futuro concessionário.

O futuro concessionário da STCP vai ter mais margem de manobra para gerir o quadro de pessoal da empresa. O Governo, que exigia que as poupanças com eventuais reduções de pessoal revertessem a favor do concedente – a Metro/STCP – admite agora que o operador que venha a ganhar o concurso incorpore nas suas contas essa redução de despesas. Ao mesmo tempo, o novo caderno de encargos alarga a possibilidade de sub-contratação a terceiros de todo o serviço prestado pela empresa.

Na primeira versão do caderno de encargos, o concessionário apenas poderia sub-contratar até 50 por cento do serviço da operadora pública. Agora, na prática, pode entregar todas as linhas a uma outra empresa, se assim o entender, o que, conjugado com as alterações inscritas na área da gestão do pessoal, deixa aberta a porta à dispensa de trabalhadores na STCP – no metro essa questão praticamente não se coloca – e à contestação dos sindicatos, que já vinham criticando o concurso aberto pelo Governo.

A tutela cedeu a muitas das reivindicações dos interessados na exploração do serviço da transportadora rodoviária. Não mexeu no preço máximo da concessão, ao contrário do que o PÚBLICO tinha ontem noticiado – mas retirou do caderno de encargos penalizações que estes vinham criticando e introduziu incentivos em caso de aumento de procura, e dilatou o prazo para o início da renovação da frota, o que, conjugado com o já conhecido aumento do prazo da própria concessão, para dez anos, parece tornar mais viável a operação dos autocarros, no Porto.

Na versão anterior, as estimativas de prejuízos rondavam os 30 milhões de euros, segundo alguns concorrentes. Agora, fonte da Metro/STCP admite que as contas acabem por ser mais interessantes para os privados, que segundo o Jornal de Negócios vão até poder criar novos títulos de viagem para tentar captar mais clientes. E até a caução de 17 milhões de euros que era pedida ao vencedor foi “substancialmente” reduzida.

A nova versão do documento ia começar a ser disponibilizada aos interessados – cerca de 20 entidades, incluindo a Câmara do Porto – ainda nesta quarta-feira. O prazo de entrega das propostas passa a ser 9 de Dezembro, pelo que na empresa se admite que, na melhor das hipóteses, o concurso esteja concluído, com adjudicação, lá para Maio ou Junho do próximo ano. Ou seja, não haverá, no caso do metro, outra hipótese que não a negociação, com o actual concessionário, do prolongamento, por mais um ano, do contrato que terminaria a 31 de Dezembro deste ano.

O novo prazo está ainda dependente do que vier a acontecer com o processo interposto pela Associação Nacional de Transportadores Rodoviários de Pesados de Passageiros – Antrop, que tenta, em tribunal, impugnar o concurso. Esta entidade, presidida por Luís Cabaço Martins, administrador do Grupo Barraqueiro – que lidera o consórcio que explora o metro e se interessou pela STCP – ainda admite analisar agora o novo caderno de encargos podendo, ou não, desistir da acção que deu entrada, há uma semana, no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto. A Metro ia entregar esta quarta-feira a resposta à providência cautelar que acompanha o processo, e na qual era pedida a suspensão do concurso.

 

Comentário SNAQ

Como mencionámos no Comunicado: já vimos este filme antes e não acaba bem.

Os concursos para a sub-concessão de serviço dos STCP e do Metro do Porto foram os primeiros a serem lançados pelo Governo no seu afã privatizador do que resta de transportes públicos de gestão pública em Portugal. Mostram despudoradamente os planos para amarrar o Estado Português a mais PPP, usando como pretexto um serviço cujas externalidades positivas nunca contam para a equação. Mobilidade sustentável e responsabilidade ambiental nem se qualificam como “verbo de encher” para este Governo.

Pedimos-lhe mais uma vez que atente no gráfico do comunicado que distribuímos à população no passado dia 9 (ver aqui última versão, entretanto subscrita pelas Comissões de Utentes) pois ele mostra o modelo que os Governos aplicaram desde o ano zero à Metro do Porto e que pretendem estender agora às restantes empresas. Se no caso do Metro do Porto a situação não se altera grandemente, ou seja, a dívida continuará a crescer exponencialmente e com isso os já astronómicos encargos financeiros, nos STCP a situação irá de mal a pior. A renda fixa anual indicada nesse gráfico, que STCP pagariam ao concessionário, representava mais 4 milhões de euros do que a actual receita. Ou seja: Governo estava à partida a impor aos STCP um prejuízo mínimo anual de 4 milhões de euros (será maior ainda pois a indemnização compensatória foi reduzida no OE de 2015). Só que isto não chega e Governo, segundo a imprensa, cedeu em áreas que representam ainda mais lucro directo para o Concessionário e mais prejuízo para o Estado. E só não afirmamos que reduziu risco para o concessionário porque este era praticamente inexistente (como em qualquer boa PPP os riscos ficam sempre do lado do Estado).

Vejamos:
- Governo retira do caderno de encargos penalizações (ou seja, concessionário pode violar contrato à vontade);
- Governo reduz caução (ou seja, não só concessionário pode violar contrato como não se tem qualquer encargo com isso);
- Dilatou o prazo para início de renovação da frota (concessionário pode adiar sine die qualquer investimento);
- Concessionário poderá despedir os trabalhadores que transitarem dos STCP (promoção de emprego precário e não qualificado mas também que Segurança Social, ao assumir encargos de subsídio de desemprego para os trabalhadores despedidos, estará por esta via a financiar lucro privado). Ao contratar novos trabalhadores com piores salários e menos direitos, o concessionário fará subir a sua fatia de lucro.
- “Incentivos” para aumento de procura servem para tapar Sol com a peneira. Quando se tem uma renda anual fixa; carta branca para despedir; fraca necessidade de investir; caução baixa e nenhuma penalização cria-se o cenário ideal para se repetir em Portugal o que já aconteceu na ferrovia privatizada do Reino Unido. Dois exemplos frequentes:
- Concessionário desiste da concessão ao fim de uns anos, devolvendo ao estado o papel de prestador de serviço e
- Estado resgata a concessão porque concessionário não cumpre contrato.

Em qualquer dos casos Concessionário podendo adiar investimento, com uma baixa caução e sem nenhuma penalização, pode bem desistir do serviço depois de extrair lucro chorudo. Frequentemente o suporte material do serviço (frotas, instalações, etc.) encontra-se em estado degradado o que requer grande investimento do Estado para prosseguir serviço. Não tendo o Estado o dinheiro da caução, ainda terá de acudir à despesa súbita.